É preciso agitar as águas e mudar comportamentos

A APMGF conta com um novo núcleo temático, no caso o Núcleo de Nutrição e Exercício Físico. Este núcleo, iniciado por três jovens médicos internos, quer ajudar os colegas a consumarem uma das suas principais e mais nobres missões: intervir na melhoria da qualidade de vida dos cidadãos através da promoção de estilos de vida saudáveis e educar para a obtenção de “um estado de completo bem-estar físico, mental e social”, como advoga a Organização Mundial de Saúde. O núcleo está recetivo e interessado em contar com participação de todos os médicos de família que queiram dar o seu contributo, ao nível científico e formativo. Para já, fica a promessa de que estará bem ativo nos grandes eventos que a APMGF promoverá em 2016 (em particular no Encontro Nacional e no Congresso Nacional) e adotará, sem reservas, um espírito irrequieto

Marisa Barros (USF Camélias – ACES Grande Porto VII), Pedro Prata (UCSP Anadia I – ACES Baixo Vouga) e Tânia Martins (USF Prelada – ACES Porto Ocidental) fizeram a proposta em agosto passado: por que não criar um Núcleo de Nutrição e Exercício Físico, na medida em que o exercício físico e a alimentação saudável são pedras basilares para uma saúde populacional coesa? Da sugestão à ação o trajeto foi curto e o núcleo passou a trabalhar, desde logo, nas suas iniciativas de fundo, alicerçadas na ideia de que o médico de família (MF) tem um papel essencial na prevenção, tratamento e reabilitação de um vasto leque de patologias e que, no âmbito dessa atuação, só pode beneficiar de conhecimentos acrescidos do ponto de vista da prescrição e aconselhamento nutricional e de exercício físico.

Embora seja, de facto, um chavão a verdade é que muitos MF em Portugal se sentem pouco preparados para estimularem os seus utentes a adotarem estilos de vida mais saudáveis ou, quando o pretendem fazer, carecem de ferramentas e estratégias para levar à prática as suas intenções.

Assim, o novo núcleo deseja (entre outros objetivos) apoiar os colegas na definição de planos de exercício e alimentação específicos que possibilitem um tratamento e reabilitação adequados, constituir grupos de trabalho cujo principal mérito será produzir recomendações sobre como organizar um plano nutricional e de exercício físico com os vários elementos da equipa de saúde (adaptado a cada doente e ao longo da sua vida), divulgar guias/algoritmos que proporcionem abordagens sistemáticas e práticas de apoio aos cuidados de saúde primários (CSP) e a outros profissionais de saúde da comunidade, de forma a otimizar os tratamentos e a melhorar os cuidados de saúde prestados aos utentes, elaborar panfletos informativos para a comunidade e organizar tertúlias e workshop focados no binómio nutrição/exercício.

Outras vontades manifestadas pelo núcleo passam por publicar artigos científicos sobre estas matérias em revistas de referência – partindo do contexto clínico dos CSP – contribuir para capacitar o sistema informático dos CSP nesta dimensão, através de escalas/tabelas com registo da alimentação (tal como no Programa de Saúde Infanto-Juvenil) e nível de atividade física/exercício dos utentes, ou levar a cabo atividades ao ar livre, no sentido de promover o exercício físico e a alimentação saudável, como por exemplo cursos sobre métodos de confeção culinária saudável, apostando numa interação direta com a comunidade.

Com vista a crescer e a alargar o seu raio de ação, o núcleo pretende ainda convidar colaboradores para áreas de trabalho específicas e criar laços com organizações nacionais e internacionais que se movimentam nesta área, abrindo a porta inclusive ao planeamento de atividades conjuntas.

Nutrição e exercício físico são indissociáveis das boas práticas na Medicina Familiar

De acordo com Pedro Prata, foi mais do que o gosto comum por esta área de intervenção que convenceu os três médicos a projetarem o novo núcleo: “a nutrição e o exercício físico são temas que um MF aborda diariamente com os doentes, quer no âmbito da prevenção, quer no âmbito do tratamento. O MF, ao ser o gestor de cuidados do utente, conhece as particularidades do mesmo. Como tal, deve ser detentor de ferramentas essenciais que lhe permitam um aconselhamento adequado sobre estilos de vida saudáveis, orientado para cada indivíduo”.

O médico da UCSP Anadia I recorda que “existem prescrições de exercício físico específicas para doentes hipertensos, diabéticos, grávidas, doentes com patologia pulmonar crónica ou até para indivíduos saudáveis em diferentes faixas etárias. Relativamente à nutrição, também são feitos cada vez mais estudos que evidenciam a importância de uma alimentação saudável”.

Os membros fundadores do núcleo querem cativar outros colegas para integrarem o coletivo, a curto/médio prazo, confiando no entusiasmo que certamente existirá em torno destes tópicos. “Quando se inicia um projeto na vida, é essencial gostar e acreditar no que se está a fazer. Os colegas que possuem um gosto especial por estas áreas e que estejam motivados a trabalhar connosco são bem-vindos. Os workshop que o núcleo vai organizar no encontro e congresso nacionais são momentos em que todos os interessados podem conhecer o núcleo, apresentar opiniões e sugestões, bem como manifestar a vontade em colaborar neste projeto”, sublinha Marisa Barros.

Sintetizar informação válida é uma das ambições

Na ótica de Pedro Prata, regista-se hoje na área da nutrição e exercício físico uma enorme produção e difusão científica, com inúmeros artigos publicados em revistas nacionais e internacionais, bem como incontáveis fontes bibliográficas de apoio para aconselhamento nutricional e de prescrição de exercício. A classe médica está, também, cada vez mais motivada para trabalhar este campo. “A grande dificuldade não é a falta de bibliografia ou recursos, mas a falta de tempo que o MF tem para rever de forma adequada os múltiplos documentos que existem nestas áreas. O núcleo reconhece a importância dos materiais e guias de apoio ao MF, tendo como objetivo a elaboração de instrumentos de apoio à prática clínica nos CSP, que permitam um acesso rápido aos conceitos básicos nestas duas áreas”.

No que respeita à realização de workshop, o núcleo já têm calendarizadas duas iniciativas para 2016 (consultar caixa em anexo), uma sobre dieta mediterrânica (no 33º Encontro Nacional) e uma segunda sobre técnicas de incentivo para a prática de exercício físico (no 20º Congresso Nacional).

A dieta mediterrânica, mais do que uma dieta é um estilo de vida, que engloba o convívio e que promove o exercício físico. Por esse motivo, dará origem ao workshop pioneiro do núcleo. Por outro lado, as técnicas de incentivo para a prática de exercício físico são essenciais, uma vez que o domínio dos conhecimentos teóricos sobre esta área não é suficiente para que o utente cumpra a prescrição do exercício. É fundamental ter conhecimentos e aplicar técnicas de incentivo, sendo que o MF ocupa um lugar privilegiado nesta tarefa”, advoga Tânia Martins.

Unir esforços com quem já está no terreno

Para potenciar os efeitos benéficos do trabalho deste núcleo, será importante desencadear parcerias com organizações cujas provas dadas nestes campo sejam inegáveis. “É na partilha de conhecimentos e na união com outras entidades que podemos crescer e tornar o núcleo mais forte. Assim, um dos nossos grandes projetos prende-se com a articulação com outras entidades, nomeadamente na área da Endocrinologia, Cardiologia, Nutrição, Desporto, entre outras. Sendo a idade escolar uma fase fulcral para a aquisição de estilos de vida saudáveis, o núcleo tem também a intenção de intervir na saúde escolar. Este objetivo é concordante com uma das áreas de intervenção previstas no Programa Nacional de Saúde Escolar 2015, que considera essencial a capacitação dos profissionais do ensino e das próprias crianças na área da alimentação saudável e atividade física”, esclarece Marisa Barros.

O núcleo tem igualmente presente a seguinte máxima: se tenciona ajudar os MF a promoverem estilos de vida saudáveis, deve numa primeira instância contribuir para que estes se consciencializem dos seus próprios hábitos alimentares e de exercício, uma vez que neste domínio é fundamental liderar através de bons exemplos. Tânia Martins destaca, aliás, a importância de se conhecerem em profundidade as rotinas dos prescritores e de o núcleo desenvolver ações neste campo, sobretudo estudos focados no comportamento alimentar e atividade física da classe: “sem dúvida que o estudo dos hábitos nutricionais e de exercício físico dos MF seria muito útil, até porque está provado que os utentes que reconhecem hábitos saudáveis no seu médico aderem melhor às prescrições, quer de exercício, quer de uma alimentação saudável. Por outro lado, não podemos esquecer que um médico que pratica exercício físico e que tem uma alimentação equilibrada tem maior conhecimento das dificuldades que o dia-a-dia atual impõe na adoção de estilos de vida saudáveis. Se o médico enfrenta estas dificuldades, também terá bons conselhos para oferecer aos doentes, por vezes baseados na sua própria experiência. Seria também interessante saber se o aumento do conhecimento nestas áreas, por parte dos MF, poderá influenciar os mesmos a adotarem estilos de vida mais saudáveis”.

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