24ªs Jornadas de MGF de Évora:
“Gostaria de estar mais otimista em relação às unidades de saúde familiar”, afirmou o presidente da ARS Alentejo, José Robalo, na sessão de abertura das 24ªs Jornadas de Medicina Geral e Familiar (MGF) de Évora, que decorrem até amanhã naquela cidade. Mas os resultados da auditoria do Tribunal de Contas (TC) às unidades funcionais dos cuidados de saúde primários (CSP) não deixam ninguém descansado. Recorde-se que, de acordo com a análise realizada pelos auditores do TC, as diferenças entre os custos médios totais (que incluem os custos com pessoal, MCDT e medicamentos) por consulta entre as USF de Modelo A e Modelo B e as unidades de cuidados de saúde personalizados (UCSP), não são muito significativas. “Neste momento, as USF estão sob o escrutínio de organismos que têm um peso específico muito significativo”. Nesse sentido, José Robalo alertou os médicos de família para a necessidade de se manterem informados sobre o desenvolvimento que se pretende para as USF porque, de facto, “não estou confortável com alguma discussão que se faz neste domínio”. O responsável da ARS Alentejo referiu ainda a necessidade das organizações representativas dos médicos de família estarem atentas a esta problemática “que eventualmente poderá ter uma discussão acesa nos próximos tempos”.
No que se refere à Medicina Geral e Familiar, “é muito difícil estarmos descansados”, adiantou. Na realidade, é possível que se esteja perante “um processo importante na mudança de estratégia”, que poderá conduzir a algumas alterações. José Robalo está convencido de que “se continuarmos a desenvolver as nossas atividades de forma consciente, dificilmente vamos ser cilindrados por qualquer alteração que se possa instalar em relação aos cuidados de saúde primários”. Mesmo assim, considera que “não devemos dar o flanco” e permitir que se façam leituras, “muitas vezes administrativas”, da prática diária dos médicos de família.
Reforma dos CSP no âmago dos debates das 24ªs Jornadas
Os prós e os contras da reforma dos cuidados de saúde primários constituíram, justamente, o tema central do primeiro grande debate das Jornadas de Évora, que contou com a participação de Carlos Nunes, diretor executivo do agrupamento de centros de saúde (ACES) de Gondomar, Celestina Ventura, da UCSP de Sines, e Jorge Ramos, coordenador da USF Planície. De acordo com este último, os aspetos positivos são inúmeros, desde o trabalho em equipa, à autonomia e ao aumento da satisfação de utentes e profissionais. Contudo, aquele responsável não esconde que as USF significam “mais trabalho, mais stresse, mais dificuldade na gestão do tempo e maior pressão”.
Por outro lado, “a remuneração depende de fatores que não controlamos”, como as falhas dos sistemas informáticos, ou decisões políticas e burocráticas como “as limpezas automáticas de listas”, “imposição de trabalho não contratualizado” ou “alterações legislativas”. Por outro lado, “a imposição de valores contratualizados” significa que “os melhores são mais penalizados ao ser-lhes exigido valores cada vez mais elevados até se tornarem impossíveis de atingir”. Neste âmbito, “a contratualização tornou-se cada vez mais complexa”, centrada nos indicadores e “sem flexibilidade para diferentes realidades”.
De facto, a reforma dos CSP “mobilizou quem tinha vontade de mudar” e “abanou” toda a organização do primeiro nível de cuidados do SNS, mas neste momento os profissionais sentem “um desvio de rumo”, ou mesmo ausência de rumo.
Não existe uma estratégia clara para os CSP
Carlos Nunes, ex-membro da Missão para os Cuidados de Saúde Primários (2005-2008), referiu que neste momento existem 390 USF e 454 UCSP a funcionar no país. Também na sua opinião, a situação atual do processo é de “estagnação” e de “centralização dos processos e das decisões”. A ausência de definição clara de uma estratégia para os CSP faz-se sentir, nomeadamente, nas restrições no acesso a Modelo B, na complexidade da contratualização e na “imposição versus negociação”.
As diferenças existentes entre USF e UCSP constituíram outro dos pontos do debate, com alguns médicos a afirmar que “os colegas das UCSP não se reveem totalmente na reforma”. Nessa medida, consideram que ambos os modelos organizacionais deverão aproximar-se cada vez mais. Aliás, a médica de família Celestina Ventura, da UCSP de Sines, defende que há capacidade suficiente para diversificar a forma de organização dos cuidados de proximidade, desde que os médicos de família, quer trabalhem numa UCSP ou numa USF, não esqueçam a sua missão e compromisso com o utente.