Reunião anual dos Médicos Sentinela
O reforço e a definição de estratégias para o futuro foram alguns dos pontos fortes da reunião anual da Rede Médicos Sentinela. Essencialmente o que se pretende é tornar a rede mais robusta em termos de notificação. Não só da gripe mas das taxas de incidência de doenças como a diabetes, depressão, DPOC, asma ou AVC.
E se um dia recebesse um convite personalizado para fazer parte da Rede Médicos Sentinela? A pergunta não é meramente retórica. De facto, esse é um dos métodos utilizados pela Rede de Médicos Sentinela da vizinha comunidade autónoma de Castilla e León (Espanha) e uma questão amplamente discutida na última reunião da Rede Médicos Sentinela de Portugal, ocorrida a 24 de janeiro, no auditório do Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge (INSA), em Lisboa.
De acordo com dados apresentados por Baltazar Nunes, investigador do Departamento de Epidemiologia do INSA, a Rede tem atualmente 113 médicos sentinela inscritos mas, segundo dados de 2013, somente 58 estiveram ativos, ou seja, fizeram pelo menos uma notificação durante esse ano. “Este é um número abaixo do desejável”, afirma o investigador. “Gostaríamos de ter taxas de participação muito mais elevadas para atingirmos níveis de robustez superiores em termos das taxas de incidência” de determinadas doenças sob vigilância da Rede. “O ideal seria que houvesse, pelo menos, 150 médicos ativos”.
A necessidade de reforçar o número de médicos sentinela foi uma das tónicas da reunião, a par de estratégias para melhorar a integração e a motivação de novos membros.
Ana Paula Rodrigues, coordenadora da Rede, explica que a metodologia para o seu alargamento geográfico assenta “na definição de um número mínimo de médicos por agrupamento de centros de saúde (ACES), em função do número de habitantes da sua área de abrangência, dinamização de reuniões, num círculo clínico, de divulgação da rede e esperar pelos voluntários. Aquilo que o nosso colega Tomás Vega Alonso, de Castilla e León, refere que estrategicamente funciona melhor é, a par dessas reuniões de divulgação, selecionar aleatoriamente os colegas porque, nesses casos, a participação e motivação será certamente diferente. Eventualmente, poderemos conjugar ambas as metodologias”.
Médicos sentinela veteranos, como Vítor Ramos ou José Augusto Simões, estão de acordo. Vítor Ramos considera que “é um dever cívico contribuir para que haja informação em saúde”. Na sua perspetiva, o método utilizado pela Rede de Castilha e León “constitui uma abordagem interessante”, sendo igualmente necessária pró-atividade para chamar à Rede os médicos sentinela inativos.
José Augusto Simões faz parte da Rede praticamente desde a sua criação. “Foi aqui que começou o meu gosto pela investigação. Entrei na Rede em 1990 e acompanhou-me ao longo de toda a minha carreira. Daí todo o meu interesse em revitalizá-la”.
Internos colaboram através das listas dos seus orientadores
Apesar dos membros da Rede Médicos Sentinela serem – obrigatoriamente – especialistas em Medicina Geral e Familiar, na reunião estiveram presentes vários internos de MGF. Nuno Pina, da unidade de cuidados de saúde personalizados (UCSP) Tábua, da ARS Centro, participa na Rede Médicos Sentinela indiretamente. “A minha orientadora de formação, Clara Correia, já tinha o gosto de poder participar na Rede mas a sua disponibilidade era reduzida, de modo que passei a colaborar com ela no que se refere à notificação”. Quando terminar o Internato, Nuno Pina pretende continuar a fazer parte da Rede, nessa altura já com a sua própria lista de utentes.
A jovem médica de família Sara Marques, do Centro de Saúde de Tondela, também começou a colaborar com a Rede ainda no Internato de MGF, através da sua orientadora, Helena Sequeira, do Centro de Saúde de Tábua.
Na sua opinião, trazer os internos para a Rede Médicos Sentinela “é uma boa aposta”. Por um lado, porque fazer parte de uma rede de estudos, “acaba por ser um incentivo extra para os internos, na medida em que isso pode ser contabilizado e valorizado em termos curriculares” e, por outro, “muitos poderão dar depois continuidade a esse trabalho e permanecer na rede, já como especialistas”.
Discussão e propostas de novos trabalhos de investigação
A reunião anual dos Médicos Sentinela constitui um fórum de debate, reflexão e planos para o futuro. Nesse âmbito, foram também apresentados, em primeira mão, os resultados de estudos de 2012 e discutidas e votadas novas propostas de investigação.
Segundo as conclusões do estudo sobre “a evolução da tendência anual de diabetes, de 1992 a 2012, na Rede Médicos Sentinela”, até 1998-2000, “a taxa de incidência foi superior nas mulheres” mas após esse período e até 2010-2012, passou a ser mais elevada nos homens”. No sexo masculino, os valores mais elevados observaram-se no grupo etário dos 55-64 anos, enquanto nas mulheres se situa entre os 65 e os 74 anos. De acordo com os autores, a inversão das estimativas de incidência de DM entre homens e mulheres “poderá estar relacionada com um aumento do diagnóstico da doença nos homens devido à maior procura de cuidados de saúde em anos mais recentes ou, por outro lado, com alterações positivas nos hábitos alimentares das mulheres ou, ainda, com a maior frequência de obesidade no sexo masculino”.
Um segundo estudo, sobre a “incidência da depressão nos cuidados de saúde primários” mostra que a depressão afeta quatro vezes mais as mulheres do que os homens. Contudo, no período em análise, “o maior aumento ocorreu em homens com idades entre os 55 e os 64 anos”.
O terceiro estudo incidiu sobre “a consulta relacionada com gravidez”, com o objetivo de avaliar o número e a proporção de gravidezes planeadas e de mulheres que recorreram a uma consulta pré-concecional. As conclusões referem que “apesar de uma grande maioria considerar ter planeado a gravidez, apenas um terço das gravidezes foram precedidas de uma consulta pré-concecional”.
Em relação aos novos estudos, para além da gripe, a Rede Médicos Sentinela vai manter em notificação a prescrição de anti-bacterianos e casos de hipertensão arterial, diabetes DPOC, asma, suicídio e tentativa de suicídio e desenvolver, em parceria com o Programa Nacional de Doenças Respiratórias, um estudo de prevalência da síndrome de apneia obstrutiva do sono.
Em discussão está ainda um estudo de prevalência de demências, proposto pela Rede de Castilla e León, assim como o desenvolvimento de linhas de investigação específicas nas áreas da depressão e diabetes.