Rui Nogueira – Presidente da APMGF:
A evolução da Reforma dos Cuidados de Saúde Primários é um desejo e uma vontade que motiva políticos e profissionais de saúde em benefício dos doentes. Mas a evolução implica inovação e desenvolvimento da ideia. A “redistribuição da propriedade da ideia” é uma estratégia mas é necessário conhecer a realidade. Pensar fora da caixa, imaginação, criação e sentido crítico obrigam a atitudes de abertura e diálogo.
Da mesma forma que defendemos e impulsionámos o início da Reforma dos Cuidados de Saúde Primários, com o mesmo vigor que estivemos desde antes do primeiro dia, com o mesmo entusiasmo que usámos a acompanhar a criação das USF pioneiras, com a mesma disponibilidade de apoio ao desenvolvimento das USF ao longo de vários anos, com a isenção e o rigor que nos caracteriza, a APMGF mantém o sentido crítico sobre a estagnação da Reforma.
Desde 2011 que se desenvolvem políticas que fazem estagnar a Reforma. Criou-se uma situação insustentável que exige medidas urgentes, sem equívocos, mas realistas. Não podemos falar em remanescente dos profissionais dos centros de saúde nem em remanescente de cidadãos. A situação que temos na realidade é uma enorme assimetria nos centros de saúde e uma iniquidade preocupante, no acesso de utentes a cuidados de saúde organizados segundo o modelo novo criado há 10 anos. Uma situação que se arrasta no tempo de forma chocante e que prolonga a estagnação da Reforma desde há 5 anos. Na maioria das Regiões não há USF. Apenas na Região Norte temos uma maioria clara de cidadãos abrangidos por USF.
No passado dia 28 de outubro foi publicado o Despacho n.º 12997/2016 do Gabinete do Secretário de Estado Adjunto e da Saúde que nomeia a “Equipa de Acompanhamento dos Estudos de Avaliação da Reforma dos Cuidados de Saúde Primários iniciada pelo XVII Governo Constitucional e centrada na transformação de Unidades de Cuidados de Saúde Primários em Unidades de Saúde Familiares, a realizar pela Escola Nacional de Saúde Pública (ENSP) e pela Direção -Geral da Qualificação dos Trabalhadores em Funções Públicas (INA)”. Ou seja, foi entendido haver necessidade de uma equipa de oito membros desenvolver o acompanhamento do estudo a realizar pela ENSP e pelo INA. A “Equipa de Acompanhamento” é coordenada pelo Professor Sakellarides e integra “dois elementos designados pela Coordenação para a Reforma do SNS na área dos Cuidados de Saúde Primários, um elemento designado pela ACSS, um elemento designado pela Ordem dos Médicos, um elemento designado pela Ordem dos Enfermeiros, um elemento designado pela Associação Nacional das USF e um elemento designado pela Associação de Unidades de Cuidados na Comunidade”. Parece estranho!
Mas é ainda mais estranho não incluir a APMGF. Foi entendido não ser útil incluir a APMGF!? Provavelmente com plena justificação. É compreensível deixarem-nos de fora porque assim temos a possibilidade e a esperança de apreciar com isenção o trabalho de investigação realizado pela ENSP e pelo INA e acompanhado pela “Equipa de Acompanhamento dos Estudos de Avaliação da Reforma dos Cuidados de Saúde Primários”. E podemos apreciar também o trabalho da Coordenação para a Reforma do SNS na área dos Cuidados de Saúde Primários.
A estratégia usada há 10 anos está esgotada. Será que ninguém vê que já não dá para criar USF da mesma maneira?!
As medidas adoptadas há 10 anos não são adequadas para os centros de saúde que não evoluíram na mesma direcção. As dificuldades são agora maiores, muito maiores, quando se compara a situação em que foi deixada uma grande parte dos centros de saúde. As soluções são agora mais difíceis e o acompanhamento e as ajudas mais escassas.
O conceito de unidades de saúde de proximidade é correcto, sem dúvida, mas carece de realismo e rigor para ser aplicável no universo dos centros de saúde. No interior e nas zonas mais isoladas também é necessário criar USF mas as características demográficas obrigarão ao estudo e à utilização de outras dimensões. Mas ficamos com esperança de que a Reforma que parou em 2011 seja avaliada, seja feito o devido acompanhamento da avaliação e seja continuada a sua coordenação. Vamos ficar na mesma?
Será que vamos ficar a saber o que é preciso fazer para criar as 400 USF que faltam no país?
Rui Nogueira
(Presidente da APMGF)
29 de outubro de 2016