Na conferência «SNS: O futuro começa hoje!»
“Precisamos de lideranças que façam
aquilo de que necessitamos”. Esta
foi das frases marcantes proferidas na
conferência “SNS: O futuro começa hoje!“, organizada pela
Fundação para a Saúde – Serviço Nacional de Saúde (FSNS) na
Fundação Calouste Gulbenkian e
no âmbito da comemoração dos 40 anos do Serviço Nacional de Saúde
(SNS), com autoria do professor
jubilado da Escola Nacional de Saúde Pública, membro do conselho de
administração da FSNS e conhecido pensador do setor da saúde,
Constantino Sakellarides. Mas é crucial ir além da discussão das
lideranças, nesta reflexão alargada sobre o SNS e as suas
perspetivas de crescimento futuro, como recordou o médico de família
José Luís Biscaia: “com certeza que todos quantos estiveram nesta
conferência já debateram muito nas
últimas semanas quem vai ser o novo ministro da Saúde ou os
secretários de Estado, mas era importante saber quantos de vós
(pessoas ativas e com papéis relevantes na área da Saúde)
já discutiram qual deveria ser o modelo de governação e gestão de
conhecimento que ajudaria a levar este processo para a frente”.
Como
gastar bem o dinheiro… enigma crónico do SNS
Relativamente
ao tão falado sub-financiamento do sistema, que muitos consideram a
praga duradoura do SNS, o presidente da FSNS José Aranda da Silva
advogou que deve ser revertido, todavia com um alerta especial: “o
financiamento adequado ao bem-estar da população só será, no
entanto, útil e eficaz se promovermos mudanças de paradigma
ajustadas aos desafios do século XXI. O SNS tem de garantir uma
resposta integrada e intersetorial às necessidades do cidadão e
temos de ser capazes de gerir o conhecimento para a mudança, através
de um adequado sistema de informação e de uma participação mais
ativa do próprio cidadão”.
Pelo
mesmo diapasão alinhou o secretário de Estado Adjunto e da Saúde,
Francisco Ramos, que reclama um uso mais otimizado dos recursos
financeiros: “é claro que é preciso mais dinheiro para o SNS (…)
o nível de financiamento de outros tempos ainda não foi
completamente recuperado e temos de perceber que nos últimos oito
anos se registou um crescimento da procura e das necessidades, que
ainda não está financiado. Mas a isto temos de aliar a tendência
para afrouxar os níveis de rigor na
avaliação prévia de introdução de novas tecnologias e
medicamentos, o desperdício que significa estarmos a gastar
muitíssimos recursos em tecnologias que não avaliamos o suficiente,
que nos são «enfiadas pela goela abaixo», seja pelos seus
promotores, seja pelos fazedores de opinião ou por quem ganha a vida
a fazer publicidade às mesmas”.
O
governante alertou também para o erro recorrente do mau planeamento
dos recursos humanos: “somos tradicionalmente péssimos a planear
recursos humanos na Saúde. Como se o passado recente não existisse,
chegamos e ficamos admirados
com uma classe médica ou muito nova ou muito envelhecida e reduzida,
olhamos para os números, que parecem equilibrados e suficientes, mas
logo nos confrontamos numa base diária com a escassez de elementos
médicos, de enfermagem ou de outros profissionais. E depois surgem
as queixas de que o ministro Mário
Centeno não emite as necessárias autorizações.
Parece-me
curto para explicar um problema que é fundamentalmente da
responsabilidade de quem trabalha, dirige e estuda os problemas da
Saúde há décadas. Há que conseguir ultrapassar isto e dinamizar o
que já fomos capazes de fazer. E aqui recordo-me
da reforma dos cuidados de saúde primários, que deu um exemplo
ímpar de como o SNS se pode organizar, mudar, ir ao encontro das
preocupações dos profissionais e resolver os problemas das pessoas.
Com a inação, corremos o risco de desperdiçar todo este
esforço”.
Já
a ex-ministra da saúde, Maria de Belém Roseira, frisou a
imperiosidade de o SNS se manter vinculado a mecanismos que premeiam
o valor
dos seus profissionais, ainda que tenha dúvidas que as atuais
circunstâncias financeiras e administrativas suportem tal caminho:
“não sei se na contratualização estamos em condições de
aprovar os incentivos que fazem acontecer a mudança, premiando e
reconhecendo o mérito de quem não tem medo de enfrentar os riscos”.
Por outro lado, Maria de Belém Roseira considerou que o mais
importante esclarecimento saído desta conferência foi a noção de
que é imperioso “construir um futuro assente na utilização do
conhecimento que temos, no sentido de transformar para melhor.
Recordando o que nos disse Beck, a modernização tem de ser
reflexiva e deve sê-lo com base no conhecimento”.
A
conferência promovida pela FSNS
dividiu-se por várias sessões temáticas, que trataram matérias
tão relevantes quanto o património e as políticas de bem-estar
associados ao SNS, as estratégias locais e adaptadas à realidade de
cada comunidade que devem ser postas em prática para consubstanciar
os valores essenciais do SNS ou a gestão do conhecimento para a
mudança.