Em nota de imprensa, a Ordem dos Médicos (OM) salienta a importância de um estudo publicado na sua revista científica, a Acta Médica Portuguesa, o qual indicia um excesso de mortalidade em Portugal desde o início da pandemia muito superior ao atribuível à COVID-19. Assim, de acordo com este estudo, entre 1 de março e 22 de abril o número de mortes acima do esperado pode chegar aos 4000 óbitos, o que corresponde a um valor cinco vezes superior ao das mortes justificadas oficialmente pela COVID-19.
O estudo em causa, publicado na Acta Médica Portuguesa, foi desenvolvido por Paulo Jorge Nogueira, Miguel de Araújo Nobre, Paulo Jorge Nicola, Cristina Furtado e António Vaz Carneiro, do Instituto de Medicina Preventiva e Saúde Pública e do Instituto de Saúde Baseada na Evidência, tendo os autores utilizado bases de dados públicas para estimar o excesso de mortalidade por idade e região, propondo níveis basais ajustados ao período de estado de emergência em vigor.
As conclusões do estudo apontam para um excesso de mortalidade associado aos grupos etários mais idosos (idade superior a 65 anos) e uma mortalidade particularmente superior à registada por COVID-19 em distritos como Aveiro, Porto e Lisboa. Segundo os autores, a mortalidade por todas as causas aumentou entre março e abril de 2020 comparativamente a anos anteriores, mas este aumento não é explicado somente pelas mortes reportadas de COVID-19. Em relação às causas, os dados sugerem uma explicação tripartida para o excesso de mortalidade: mortes por COVID-19 identificadas pelas autoridades, mortes por COVID-19 mas não identificadas e diminuição do acesso a cuidados de saúde. O estudo avança também números preocupantes que podem ajudar a compreender melhor este fenómeno, como por exemplo o facto de durante o período analisado se terem registado menos 191.666 doentes com pulseira vermelha nos hospitais, menos 30.159 com pulseira laranja e menos 160.736 com pulseira amarela.
Na já mencionada nota de imprensa, o bastonário da OM, Miguel Guimarães, frisa que a Ordem desde há muito tem alertado para “a forma como os serviços de saúde estavam a reorganizar-se, pelos riscos de deixar outros doentes de fora da resposta, com patologias que precisam também de acesso em tempo útil a cuidados de saúde e que não se compadecem com esperar pelo fim da pandemia”. Miguel Guimarães sugere que as autoridades de saúde nacionais criem “uma task-force que funcione de forma articulada e que olhe rapidamente para estes dados para poder redesenhar a resposta aos nossos doentes que continuam a precisar de nós e a contar connosco. O milagre de Portugal de que tanto se tem falado não nos pode deixar confortáveis se não conseguirmos melhorar a resposta em todas as frentes”.