A sessão «As múltiplas faces da Demência», organizada no 37º Encontro Nacional pelo Grupo de Estudos de Saúde Mental (GESM) da APMGF, provou que a MGF pode e deve intervir na prevenção e tratamento da demência, com o apoio de especialidades como a Psiquiatria e a Neurologia.
Nuno Florêncio, coordenador do GESM, recordou que o doente com demência “ denega massivamente sintomas e realidade e é habitualmente trazido à consulta por familiares ou amigos. É, portanto, fundamental criar uma aliança terapêutica com o doente e a família”, até porque “a relação médico-doente é em si mesma terapêutica”. Em suma, de acordo com este MF, “as atitudes do médico face ao doente, a doença e a família são determinantes”.
Para o psiquiatra Frederico Couto (Hospital de Santa Maria), é antes de mais essencial concentrar baterias nos comportamentos clínicos que permitem obter reais ganhos preventivos na demência, deixando de lá estratégias que comprovadamente representam uma perda de tempo: “não existem evidências clínicas que a introdução de qualquer suplementação alimentar possa fazer diminuir os riscos para demência”. Já sobre os critérios de referenciação para Psiquiatria, Frederico Couto frisou que esta deve acontecer quando é feito “um diagnóstico diferencial entre depressão e demência e quando a demência em causa possa beneficiar de tratamento farmacológico específico”.
Já no que respeita à referenciação para Neurologia, a neurologista Juliana Castelo (Hospital Beatriz Ângelo), sublinhou que tal deve concretizar-se se existirem queixas cognitivas em relação a estado prévio, se forem persistentes, com agravamento progressivo em meses e corroboradas por acompanhante, ou se surgirem em indivíduos deprimidos e se mantenham, apesar de existir tratamento instituído. Também poderá ser a via adequada se o doente apresentar queixas subjetivas de perda de memória com agravamento progressivo e impacto no dia-a dia. A neurologista acredita, porém, que o sucesso nestes doentes depende acima de tudo de um trabalho conjunto de muitos profissionais de saúde: “os doentes com demência e os seus familiares beneficiam muito do trabalho em equipa multidisciplinar”.
Mariana Anete Mira, MF e coordenadora de equipa comunitária de suporte em cuidados paliativos, adianta que “é muito importante começar por explicar aos familiares e cuidadores a progressão irregular da doença, melhorar a comunicação, explicar estratégias úteis ao cuidador e abordar questões sensíveis como as mudanças na alimentação e a perda progressiva de capacidades”. A mesma médica acredita também que é indispensável, para a evolução favorável do doente com demência, pensar no cuidador, “prevenir o seu burnout, preservá-lo e elogiá-lo”. Por outro lado, esta médica com pós-graduações em cuidados paliativos e geriatria alerta para um facto relevante na gestão terapêutica de doentes em fases mais avançadas de demência: “não podemos ter receios de desprescrever, porque em alguns doentes a desprescrição pode mesmo melhorar a sua qualidade de vida”.