Neste ano de 2021 as jornadas do Grupo de Estudos de Doenças Respiratórias (GRESP) da APMGF, na sua sétima edição, regressaram em formato híbrido – presencial e on-line – com 230 participantes no espaço físico do evento (PT Meeting Center) e 291 a acompanharem os trabalhos através da plataforma eletrónica. Para o coordenador do GRESP, Rui Costa, este modelo híbrido moldado em grande medida pela pandemia pode encerrar aspetos francamente positivos para a iniciativa e para a atualização científica em doenças respiratórias: “se quisermos crescer e chegar a muitos médicos de família este pode ser um modelo de continuidade, sabendo até que um número elevado de colegas que pretendem estar connosco presencialmente não o conseguem fazer. É inegável que existem cada vez mais constrangimentos no presente, os profissionais começaram a fazer um maior volume de consultas presenciais nas unidades e podem não ter a disponibilidade para estar no espaço físico das jornadas. Por outro lado, a plataforma digital permite aos participantes não só assistirem às sessões em direto, mas também em diferido, se for do seu agrado”.
Nestas sétimas jornadas do GRESP foi lançado o «Guia Prático de Gestão da DPOC», ferramenta extremamente útil para os especialistas de MGF no seu quotidiano e que foi editado com o apoio da GSK e da Bial. A obra surge na sequência do «Guia Prático de Gestão da Asma nos CSP», já divulgado pelo GRESP/APMGF e que tal com este ficará de imediato disponível para descarregamento e consulta por parte dos médicos de família portugueses. “Estes são dois guias de referência para os CSP, que resumem o estado da arte da asma e da DPOC mas de uma forma dirigida à prática clínica dos MF em Portugal e no sentido de estes poderem fazer uma abordagem estruturada, personalizada e de qualidade”, avança Rui Costa.
Pese embora o último ano e meio tenha sido muito difícil para todos quantos integram o sistema de saúde no nosso país, o coordenador do GRESP sublinha que este grupo de interesse da APMGF nunca baixou os braços ou abandonou a sua missão de partilha científica: “houve discernimento, vontade e o dinamismo necessário para estarmos presentes junto dos médicos e atualizarmos conhecimentos, inclusivamente adaptados à realidade da doença COVID, como aconteceu nas múltiplas publicações relacionadas com a asma e a DPOC, ou nas recomendações direcionadas para os doentes com SAOS e que recorrem a aparelhos de ventiloterapia”.
Ensinamentos válidos da luta contra a Covid
Na conferência inaugural destas jornadas o presidente da Associação Nacional dos Médicos de Saúde Pública (ANMSP), Ricardo Mexia, analisou as mais valias e as lições que podem ser extraídas da experiência pandémica, ao nível da prevenção e mitigação das patologias respiratórias, defendendo que “medidas simples que adotámos e continuamos a adotar, como a colocação de máscaras ou higienizar as mãos na entrada de um novo espaço, podem manter-se úteis. Mesmo no que respeita às restrições de distanciamento físico, embora possam não ser necessárias para muitos de nós, podem continuar a fazer sentido para grupos restritos, como a população idosa e com multimorbilidade, sendo benéfico pensar em evitar ajuntamentos destas pessoas durante o inverno que se aproxima”. Por outro lado, mesmo que muitos dos contactos à distância mantidos entre médico e doente durante o último ano e meio não se possam caracterizar exatamente como telemedicina, a verdade é que este período possibilitou projetar um futuro em que a prestação de cuidados pode ser mais digital, sem perder qualidade e abrangência, como explicou o presidente da ANMSP: “a experiência que tivemos pode abrir portas para implementar uma verdadeira telemedicina e seguramente haverá utentes para quem esta estratégia acarreta vantagens”. Acima de tudo, Ricardo Mexia defendeu que o SNS e o país não estavam acautelados para uma crise sanitária de tamanha magnitude e deixou uma advertência: “espero que no futuro haja um investimento na preparação para este tipo de situações, envolvendo todos os grupos de profissionais e os cidadãos, para que perante uma futura ameaça deste género – que surgirá sem dúvida – estejamos melhor preparados e a resposta seja mais ágil e consentânea com um país que tem um SNS robusto”.
Outra dimensão crítica da Covid (doença multissistémica que tomou o mundo de assalto mas que, na maioria dos doentes, se manifesta sobretudo e na fase inicial como uma patologia respiratória) é a que envolve a gestão dos pacientes com sintomas a longo prazo, situação comummente designada por Long Covid. Na sessão das jornadas dedicada ao seguimento do doente pós-Covid, a médica interna de MGF Ana Sofia Ferreira descreveu o processo de criação e os resultados da consulta de seguimento destes doentes iniciada na USF Tejo (ACeS Loures/Odivelas). Segundo esta jovem médica, a consulta nasceu devido a motivações muito simples: “quando iniciámos o processo, em janeiro/fevereiro e à medida que os doentes iam surgindo com sintomas persistentes, existiam poucas guidelines nacionais e internacionais nesta área. A criação da consulta dedicada surgiu, pois, da vontade de dar resposta aos nossos utentes e de conhecer melhor esta síndrome”. Ana Sofia Ferreira reforçou que “a recuperação destes doentes é longa e lenta” e que as equipas de saúde dos CSP ainda hoje estão “carenciadas de estratégias e meios para oferecer às pessoas, para além do aconselhamento ao nível do self-management e da referenciação para a reabilitação”.
Carla Araújo, especialista em Medicina Interna do Hospital Beatriz Ângelo (onde coordena uma consulta para doentes com sequelas da Covid), alertou nestas jornadas que um dos sinais mais comuns que muitos destes doentes apresentam a longo termo, o cansaço generalizado e inespecífico, deve ser encarado pelos MF com a devida precaução: “quando o doente surge em ambulatório com um cansaço não identificado e persistente (alguém que até foi tratado em casa, nunca chegou a ser visto num hospital ou a realizar meios complementares de diagnóstico), é preciso pensar num eventual tromboembolismo periférico, porque se for esse o caso o doente precisa de fazer anti-coagulação, sob pena de colocarmos em risco a sua vida”.
Outro dos tópicos fortes das jornadas foi o desenho e implementação de indicadores da área respiratória para os CSP, para os quais aliás o GRESP tem contribuído, numa colaboração com os serviços da Administração Central do Sistema de Saúde. A este propósito, a diretora da área das Doenças Respiratórias na Direção Geral de Saúde, Cristina Bárbara, afirmou nas jornadas que “quando se torna fundamental escolher indicadores nesta área devemos estar focados nos resultados e na criação de valor para o doente. Assim, quando estamos a pensar num indicador devemos ponderar, por exemplo, se é provável que através da melhoria desse indicador consigamos reduzir as exacerbações e os internamentos evitáveis por asma”.