Em declarações proferidas no programa «Expresso da Meia-Noite», emitido na SIC Notícias e no qual foi um dos convidados para discutir a evolução do combate à pandemia de Covid-19, bem como o impacto desta doença no sistema de saúde e na sociedade portuguesa, o presidente da APMGF defendeu que não será possível aos profissionais dos cuidados de saúde primários (CSP) aguentarem durante muito mais tempo a carga de trabalho adicional a que têm sido sujeitos: “vigiamos 90% a 95% dos doentes positivos, suspeitas de infeção e contactos diretos com pessoas infetadas. Isto é um volume de trabalho absolutamente gigantesco, sobretudo quando pensamos naquilo que foi a nossa terceira vaga e porque temos de fazer a vigilância telefónica de forma quase diária. Imagine-se o que significa para uma equipa de saúde familiar, para um médico de família (MF), ter de fazer 80, 90, 100 chamadas e ainda ter ao lado os seus doentes para ver (…) Os centros de saúde não vão aguentar, não temos recursos humanos e não conseguimos estar em dois sítios ao mesmo tempo, nem podemos fazer omeletas sem ovos”.
Nuno Jacinto frisou que os profissionais dos CSP são “desviados permanentemente para tarefas Covid”, ora para as Áreas Dedicadas aos Doentes Respiratórios (ADR), ora para a vacinação, onde têm permanecido “inexplicavelmente quase sozinhos deste o início deste processo”, algo que retira aos MF obviamente “a capacidade para ver todos os outros doentes” e que resulta em muitas consultas desmarcadas e atos clínicos cruciais adiados.
Para o presidente da APMGF é também manifesto que, independentemente das vacinas serem administradas em grandes centros ad hoc, ou nas instalações das próprias unidades dos CSP, “se continuarmos a usar os recursos dos centros de saúde – médicos, enfermeiros, administrativos – não devem restar dúvidas de que vamos responder à vacinação mas à custa de não conseguirmos responder a tudo o resto”. Assim, embora reconheça que esta vacinação é prioritária para o país, Nuno Jacinto advoga que não é possível “que se peça aos profissionais que façam as duas coisas ao mesmo tempo e que se resolva um problema criando outro”.
Instigado a comentar eventuais restrições que venham a ser impostas antes da época natalícia, tal como foi aventado durante a última reunião de peritos no Infarmed, o dirigente associativo defendeu que “não podemos olhar para elas de forma isolada. Se não reforçarmos os recursos humanos no sistema de saúde, por muitas restrições que façamos vamos assistir à continuação dos fenómenos registados no ano passado, não ao mesmo nível de internamentos e mortes, como é evidente, mas com uma sobrecarga gigante nos centros de saúde. E se os centros de saúde falham, vão falhar as urgências a seguir e daí por diante”.