Após várias horas de reunião, o Fórum Médico – que reúne as principais estruturas representativas dos médicos a nível nacional – rejeitou de forma veemente e considerou inaceitável a estratégia do Governo e do Ministério da Saúde de colocar colegas indiferenciados em agrupamentos de centros de saúde (ACeS) cuja taxa de cobertura de médico de família (MF) seja inferior à média nacional e onde não seja possível fixar especialistas no presente, permitindo-lhes inclusive que assumam a gestão de uma lista de 1900 utentes, tal como definido na Lei do Orçamento de Estado para 2022. A reunião, agendada com carácter de urgência, serviu para avaliar o impacto da decisão do Governo, bem como antever potenciais medidas a adotar para combater este atentado à integridade da Medicina Geral e Familiar (MGF) e à qualidade dos cuidados prestados aos utentes. Leia o comunicado da Reunião do Fórum Médico.
De acordo com o presidente da Associação Portuguesa de Medicina Geral e Familiar (APMGF), “as entidades representadas no Fórum Médico foram unânimes em condenar a recente legislação publicada. Todas consideram que não podemos substituir MF por médicos sem especialidade, que estamos perante um retrocesso e uma solução do Governo que se assemelha a uma espécie de fuga para a frente, um recurso de última linha e em desespero por não conseguir captar novos MF”. Ora é precisamente nesta dimensão que a tutela tem de apostar, se deseja reverter o contexto complicado que atravessamos, explica Nuno Jacinto: “a principal solução apontada pelo Fórum Médico é a de fazermos um esforço, enquanto país, para tornar o Serviço Nacional de Saúde (SNS) atrativo para os MF, quer para os mais novos que vão acabando a sua especialidade, quer para os mais velhos que lá estão e que pensam em sair”.
De facto, o dirigente associativo vinca que o Ministério da Saúde tem mesmo de se empenhar em contratar os novos colegas que terminam a sua especialidade todos os anos, para além de “reconhecer a importância da MGF e daquilo que conquistou ao longo de quatro décadas”, com a consequente valorização de quem trabalha já nas unidades dos cuidados de saúde primários, ao invés de “enveredar por respostas mais fáceis”.
Embora não tenham saído deste Fórum Médico decisões bem definidas sobre protestos a realizar, Nuno Jacinto afirma que foi dado como adquirido por todas as organizações envolvidas que nos próximos tempos serão inevitáveis “medidas que reflitam a insatisfação dos profissionais, medidas essas que se tornarão progressivamente mais robustas”. A APMGF, pela sua parte, está já a delinear um conjunto de iniciativas de protesto gizadas para terem um efeito público maximizado nas próximas semanas, apelando a todos os colegas que permaneçam atentos, com vista a darem o seu contributo na defesa da MGF e de cuidados de saúde primários merecedores desse nome.
“Nós temos no país mais MF do que aqueles que são necessários para o SNS, mas o problema é que temos fora do SNS pelo menos 1400 especialistas”, afirmou Miguel Guimarães aos jornalistas, no final do Fórum. Segundo o bastonário da OM, a opção do Governo é “extraordinariamente grave”, já que o papel dos especialistas em MGF “na orientação dos doentes, diagnóstico e encaminhamento é insubstituível”. O bastonário sublinhou, ainda, que os serviços de apoio jurídico da OM vão analisar em detalhe a legalidade desta medida e defendeu que caso o executivo não dê um passo atrás, “os próximos tempos serão muito difíceis”, com o desânimo a instalar-se nas hostes da MGF e uma maior fuga de MF do SNS a projetar-se no horizonte.