Jornadas de MGF dos Açores quebram isolamento na Ilha do Pico

Cerca de 170 participantes fizeram da 20ª edição das Jornadas de Medicina Geral e Familiar (MGF) dos Açores – evento organizado pela Delegação Regional dos Açores da APMGF – uma iniciativa de características únicas, já que durante três dias foi possível realizar numa ilha com menos de 14 mil habitantes umas jornadas de atualização médica com impacto quer para a comunidade de médicos de família (MF) açorianos, quer para muitos colegas que viajaram de outras partes do país.

“O balanço destas jornadas é extremamente positivo e é com grande orgulho – e até alguma emoção – que chegamos ao fim das mesmas. Eu e a colega Milene Aranda, também MF na Ilha do Pico, sempre sonhámos trazer estas jornadas ao Pico. Com a evolução da ilha, a construção do Auditório da Madalena e o surgimento de outros serviços nas áreas da hotelaria, restauração, etc., tivemos a possibilidade criar as condições necessárias para avançarmos com a realização das jornadas no Pico”, explica Vanessa Amaral, membro da comissão organizadora das Jornadas de MGF dos Açores.

A também vogal da Delegação Regional dos Açores da APMGF considera que o sucesso das jornadas foi particularmente significativo face às condições de acesso ao local do evento: “chegar à Ilha do Pico é muito diferente de chegar a uma ilha mais central, como São Miguel ou a Terceira, ilhas para as quais existem mais ligações aéreas. No caso do Pico, a logística é diferente e exige uma melhor coordenação e reservar espaços com maior antecedência (…) Felizmente, tivemos muito apoio da Delegação Regional dos Açores da APMGF e da APMGF a nível nacional, como como da Câmara Municipal da Madalena. Com tudo isto, foi possível trazer para uma ilha pequena dos Açores (embora com a montanha mais alta de Portugal) formação, conhecimento e partilha de experiências, conseguindo estar no «topo» da MGF durante estes três dias”.

Já Milene Aranda, membro da comissão organizadora e representante do Conselho Médico da Região Autónoma dos Açores da Ordem dos Médicos, assegurou que se trata de um excelente sinal o facto desta iniciativa ter sido organizada no Pico e pela MGF “uma especialidade que na realidade insular dá suporte à maior parte dos cuidados prestados à população da Região. A Ordem quer manter este apoio, facilitar a formação e a deslocação e trazer as mesmas oportunidades aos internos açorianos de que beneficiam colegas mais próximos dos grandes centros formativos”.

O presidente da APMGF, Nuno Jacinto, declarou na cerimónia de encerramento das 20ªs Jornadas de MGF dos Açores que este evento corporizou a filosofia que a APMGF quer preservar no presente e no futuro: “quando afirmamos que queremos estar próximos dos MF e dos nossos associados, não apenas em Lisboa ou no Porto, tal significa que desejamos estar próximos também em locais como a Ilha do Pico, onde se vê a força da nossa especialidade e da nossa Associação”. Nuno Jacinto sublinhou, a este propósito, que nos Açores e particularmente em ilhas como o Pico, “o papel do MF é ainda mais importante. De facto, o que seria destas populações se não tivessem MF, quem lhes prestaria assistência e que cuidados de saúde estariam à sua disposição? Tudo seria muito mais complexo e pior para estes cidadãos, pelo que deixo aqui o agradecimento da Direção Nacional da APMGF por todo o trabalho que os colegas fazem, não só ao nível associativo, mas também enquanto MF”.

A secretária regional da Saúde e do Desporto dos Açores, Mónica Seidi, garante que este tipo de eventos de formação médica “será sempre apoiado pela Secretaria Regional da Saúde, uma vez que permite a troca de conhecimentos e de experiências, não apenas no que respeita àquilo que está preconizado nos livros, guidelines e artigos, mas também no que surge ligado à nossa prática clínica diária. Trata-se de um enriquecimento pessoal imprescindível para qualquer médico e que nunca pode ser descurado, devendo ser uma preocupação constante no nosso percurso”.

A Governo Regional tem feito um esforço considerável nos últimos anos para fazer frente ao desafio das populações ainda a descoberto e sem MF atribuído no arquipélago mas, de acordo com Mónica Seidi, existem condicionantes específicas dos Açores que são muito difíceis de ultrapassar: “devemos assumir, à partida, que estamos aquém do que gostaríamos de ter, embora melhor do que em alguns períodos do passado. Neste momento, contamos com perto de 70 especialistas em MGF a exercer nas nove ilhas, sendo natural a captação e fixação mais facilitada de profissionais nas grande ilhas, como São Miguel ou a Terceira. Há, no entanto, que perceber a influência da questão arquipelágica. Em muitas das nossas ilhas as condições de prática são especiais, sobretudo em unidades de saúde mais isoladas e distantes de hospitais. Assim, necessitamos de clínicos aptos a exercer a MGF mas também muitas vezes com apetência e vocação própria para fazer urgência. Ora, nesta fase atual, esta tem representado uma grande dificuldade na captação e fixação de especialistas em MGF”.

Com o intuito de melhorar o referido recrutamento e fixação de MF nos Açores, sobretudo a partir do exterior do arquipélago, a governante frisa que as autoridades regionais têm apostado em estratégias complementares para incrementar a atratividade dos locais de trabalho: “temos neste momento em vigor medidas pecuninárias, que contribuem para o acrescento remuneratório, bem como outros incentivos. Mas é fundamental explicar a todos que existem outros fatores, associados à experiência de vida nos Açores que os colegas dificilmente poderiam ter em território continental. As listas de utentes são de facto similares, mas a vivência familiar e social pode ser bem diferente e vital na sua decisão, já que existem oportunidades únicas para as famílias e para as crianças que influem bastante na qualidade de vida, face a uma melhor gestão do tempo e da dinâmica familiar. Neste contexto, temos de apontar coisas simples mas relevantes, como a ausência de trânsito ou a circunstância de as distâncias a percorrer no quotidiano serem muito mais curtas, o que faz os profissionais perderem menos tempo”. Mónica Seidi acredita que a opção pelos Açores, a ser concretizada por qualquer MF, é uma escolha muito pessoal mas pode ser melhor fundamentada com verdadeiro conhecimento sobre a realidade local: “mais do que estar aqui a «vender o nosso peixe», seria interessante os colegas virem até aos Açores e visitarem as ilhas neste contexto, não numa perspetiva turística, mas antes com uma abordagem profissional, percebendo in loco quais as vantagens que a Região lhes pode oferecer”.

Diga-se, a propósito, que foi de particular relevância durante estas jornadas a visita feita à Unidade de Saúde da Ilha do Pico – Centro de Saúde da Madalena, durante a qual os participantes inscritos tiveram a oportunidade de conhecer instalações onde a prática de MGF tradicional se alia a um vasto conjunto de outros serviços (incluindo pequena cirurgia, emergência médica, realização de meios complementares de diagnóstico ou internamento), essenciais numa ilha que não dispõe de um hospital e coordenados por MF, num cenário que deixou os visitantes muito bem impressionados com as condições de trabalho e a versatilidade da equipa de saúde ali sediada.

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