Rosália Páscoa (médica de família na USF Homem do Leme – ACeS Porto Ocidental – professora convidada no Departamento Medicina da Comunidade, Informação e Decisão em Saúde – MEDCIDS – da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto – FMUP – e presidente da Sociedade Portuguesa de Medicina do Estilo de Vida – SPMEV) tornou-se a mais recente doutorada com origem na MGF, ao concluir no passado dia 30 de maio, na FMUP, as suas provas académicas, tendo apresentado a tese «Lifestyle interventions in Family Medicine». Uma tese suportada, como o nome indicia, num conjunto de estudos que visam melhorar a evidência relativa às intervenções no estilo de vida efetuadas em Portugal e no âmbito da MGF.
Entre estes trabalhos inclui-se um estudo transversal, de base populacional, numa amostra representativa da população adulta geral portuguesa, com idade igual ou superior a 20 anos, com um total de 900 participantes, um segundo estudo no qual se avaliou a prevalência da multimorbilidade em Portugal e a sua associação com o estilo de vida e fatores sociodemográficos (que relevou uma prevalência de multimorbidade de 48,9%) e um terceiro estudo (longitudinal e retrospetivo), numa base de dados de mundo real, da Administração Regional de Saúde do Norte (ARSN), que teve como objetivos determinar a prevalência de obesidade e caracterizar a população adulta obesa no norte de Portugal do ponto de vista biodemográfico, perfil de comorbilidades e uso de recursos de saúde. No âmbito deste doutoramento, Rosália Páscoa elaborou ainda um protocolo de um ensaio pragmático randomizado, sobre consultas médicas virtuais compartilhadas na abordagem do estilo de vida na diabetes tipo 2. Nas conclusões do seu trabalho, a doutorada defende que faz “sentido uma visão do futuro em que a prática clínica operacionaliza adequadamente as intervenções no estilo de vida, onde as escolas médicas abordam de forma mais prática a implementação de intervenções no estilo de vida, em que aqueles que se dedicam à investigação implementam metodologias robustas para estes tópicos e onde os decisores políticos priorizam as circunstâncias certas, que permitem a mudança positiva nos resultados em saúde”.
O júri destas provas foi presidido por Fernando Schmitt (FMUP) e integrou como arguentes José Augusto Simões (Universidade da Beira Interior), Inês Rosendo (Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra) e José Mendes Nunes (Nova Medical School). O orientador foi Carlos Martins (FMUP) e a co-orientadora Andreia Teixeira (FMUP).
Permanece deficitária a investigação sobre intervenções nos estilos de vida e papel do MF nessa área
Segundo Rosália Páscoa, existem razões bem fundadas para a escolha da temática que molda a tese de doutoramento apresentada na Invicta: “em Portugal, não existem muitos estudos na área das intervenções no estilo de vida. Especificamente, não há nenhum estudo sobre as perspetivas da população sobre intervenções no estilo de vida, nem sobre o papel atribuído ao médico de família (MF) nesta área. O primeiro objetivo da tese, foi estudar estes aspetos. Além disso, não há estudos do mundo real sobre, por exemplo, a população com obesidade (fator amplamente relacionado ao estilo de vida). Como grande segundo objetivo da tese, estudou-se a população obesa da ARSN e fez-se a sua caracterização com base em dados do mundo real, obtidos dos registos eletrónicos dos MF”.
A doutorada explica que “adicionalmente, nos últimos anos, Portugal tem enfrentado diversas dificuldades em termos de cuidados de saúde. A necessidade de implementação de novas abordagens, tem sido reconhecida. Assim, um terceiro objetivo foi determinar se, em relação aos cuidados habituais, as consultas médicas partilhadas na abordagem do estilo de vida na diabetes tipo 2 podem ser uma nova oportunidade”. Para a médica de família da USF Homem do Leme, “os temas deste trabalho, amplamente enquadrados na MGF, contribuem para reforçar e tornar mais robusta a posição da MGF como uma disciplina (académica e científica) e, simultaneamente, como uma especialidade clínica orientada para os cuidados de saúde primários”.
Questionada sobre os motivos que a levaram a optar por esta via de investigação no quadro do seu doutoramento, Rosália Páscoa não esconde o seu fascínio pelo campo da Medicina preventiva e de proximidade: “sou médica de família e foi no contacto com os utentes que tudo começou! A área do estilo de vida, por me parecer fundamental e estratégica, sempre me interessou. Várias interrogações foram surgindo. Senti a necessidade de perceber melhor o estado das coisas, de investigar”.
Na ótica da docente da FMUP, a realização de um doutoramento acaba por ser um passo lógico e representa “um caminho de crescimento profissional/académico e, também, pessoal. Parece-me que proporciona uma perspetiva mais ampla e crítica da realidade, fornecendo ferramentas para compreender a prática profissional de forma mais completa. Em termos académicos, contribui para tornar mais robusta a formação médica e ampliar a evidência científica, neste caso concreto, da MGF”.