APMGF e AICIB renovam empenho no apoio à investigação em MGF

No âmbito da parceria entre a Associação Portuguesa de Medicina Geral e Familiar (APMGF) e a Agência de Investigação Clínica e Inovação Biomédica (AICIB), o 40º Encontro Nacional de MGF acolheu a sessão «Vende-nos o teu projeto», durante a qual atribuiu três bolsas de apoio à investigação no valor de 3 000 euros aos projetos «Que elementos da mudança de comportamento (motivação, capacidade, oportunidade) são mais determinantes da alteração de prática clínica de acordo com a melhor evidência disponível em médicos internos de MGF?», da autoria de Catarina Viegas, “Descrever os níveis de Segurança Psicológica em equipas multiprofissionais prestadoras de Cuidados de Saúde Primários (CSPs), e explorar a sua associação com o desempenho assistencial», de Ricardo Fráguas e «Qual o efeito de uma aplicação informática no controlo de outcomes relacionados com dor e qualidade de vida na população portuguesa seguida em Cuidados Paliativos?», de Álvaro José Silva. Outros dois projetos finalistas vão receber uma menção honrosa no valor de mil euros e mentoria a designar pelo Departamento de Investigação da APMGF, a saber, «Que perceções têm os dirigentes, políticos e jornalistas (stakeholders envolvidos no processo de decisão e comunicação em saúde) relativamente à missão, contexto e forma de atuação dos Cuidados de Saúde Primários (CSP)?», de Gonçalo Envia e «Quais são as necessidades dos cuidadores informais de idosos em Portugal?», da autoria de Rita Lopes Silva. Os mentores que avaliaram as propostas foram Armando Brito de Sá, Liliana Guerra e Jaime Correia de Sousa, depois de ouvirem um pitch de 5 minutos feito pelos autores, com objetivo de «vender» o seu projeto. Estas bolsas atribuídas pela APMGF e AICIB têm como finalidade incrementar a investigação realizada em sede de cuidados de saúde primários e MGF e aproximar a academia ao contexto da prática nas unidades de saúde.

Ricardo Fráguas considera ser “excelente que a APMGF tenha este tipo de iniciativas, obriga a que nos cheguemos à frente e possamos construir algo, com um prazo que acaba por ser um estímulo grande para pensarmos e desenharmos um projeto. Mais do que a bolsa, a possibilidade de contar com uma tutoria é algo de muito bom”. Por seu turno, Álvaro José Silva destaca como louvável a atitude da APMGF e da AICIB “em tentar juntar a academia e a nossa prática clínica. No fundo, é um incentivo para continuarmos estes projetos, uma mais-valia para passarmos das ideias à prática. Infelizmente, as oportunidades de financiamento em Portugal não são as melhores, pelo que me resta agradecer o apoio e parabenizar as duas entidades por esta iniciativa”. Catarina Viegas concorda que todos os participantes na sessão se sentiram “mais motivados” para encarar o futuro e que a ideia da APMGF e AICIB “é muito bem-sucedida nesta aproximação entre a academia e a investigação desenrolada no terreno, facto comprovado por conseguir captar muitos colegas interessados e a concorrem às bolsas”. A moderadora da sessão e vice-presidente da APMGF, Paula Broeiro, frisa que este programa de apoio da APMGF e AICIB demonstra assinalável fôlego e tem inegáveis méritos: “queremos intervir num contexto crítico para os CSP, que é a área de produção de conhecimento e este programa vem criar mais um espaço que os colegas podem procurar com confiança, munidos de uma pergunta com a potencialidade de mudar a prática clínica”.

MF podem e devem potenciar as suas capacidades para educar em saúde

Na sessão «Médicos de Família 4.0», foram descritos três percursos individuais de representantes da especialidade que comprovam como os médicos de família (MF), desde que possuam energia e tempo disponíveis, conseguem educar em saúde e comunicar com as populações utilizando as plataformas digitais ou os mass media. Margarida Santos, médica na USF do Arco (ACeS Lisboa Central) contou a sua experiência enquanto dinamizadora do podcast “A curiosidade salvou o gato” e colaboradora da «Consulta Aberta», espaço de esclarecimento em saúde da SIC, defendendo que os MF podem fazer muito pela literacia em saúde fora das suas listas, se perderem complexos sem sentido: “entre os profissionais médicos ainda persiste um grande estigma, uma imensa desvalorização daquela que uma grande capacidade nossa, já que temos enquanto médicos de família grande poder de literacia em saúde”. Margarida Santos diz compreender as barreiras que muitos MF enfrentam para trabalhar a comunicação fora do consultório, mas acredita que estas podem ser contornadas com algumas exigências básicas: “a única forma de valorizar este trabalho das redes sociais e da literacia em saúde começa por reclamar espaço nos currículos e nos horários (…) é preciso entender que este é um trabalho que requer esforço, equiparável à investigação cientifica, por exemplo”.

Já Nádia Sepúlveda (USF Salutis – ACeS Cávado I – Braga), que desenvolve o projeto «Momento Médico» em podcast, no Instagram e Youtube e cria conteúdos de educação para a saúde nas redes sociais, revelou que ao longo dos últimos cinco anos tomou consciência de que tal experiência a fez “crescer muito enquanto pessoa e enquanto médica. Até a minha forma de comunicar se simplificou, permitindo aproximar-me dos doentes. Fiz o curso na Universidade do Minho, onde a comunicação com o doente sempre foi algo de muito importante. Assim, senti que já tinha esta facilidade de posicionar-me e conversar com os doentes de uma maneira menos coloquial, algo que só foi crescendo com esta trajetória nas redes sociais”. A jovem médica reconhece, porém que existem desafios para quem se lança na comunicação através de novos meios digitais: “por vezes pensamos se falar do produto X será mal interpretado e temos sempre de não perder de vista o equilíbrio entre sermos médicos e figuras que comunicam nas redes sociais. E há sempre a tentativa por parte das pessoas de não distinguirem entre aquilo que é uma rede social e uma consulta”.

Mia Couto troca impressões com MF que também são ávidos leitores

O terceiro dia do 40º Encontro Nacional de MGF fechou com chave de ouro, graças a uma sessão especial do Clube de Leitura APMGF, centrada na obra «Venenos de Deus, Remédios do Diabo», do escritor Mia Couto, o qual esteve presente em Vilamoura para discutir este e outros escritos do seu percurso literário.

Foi uma surpresa muito agradável ver médicos que leem livros num clube de leitura com esta dinâmica e é algo de muito bonito. De facto, até me tinha esquecido que escrevera uma estória com um médico que depois se envolve numa trama não relacionada com o exercício da sua profissão”, adianta Mia Couto. O autor moçambicano acredita que a literatura “nos lembra que nos forjamos como pessoas ouvindo a voz dos outros e as estórias dos outros e criando uma estória para nós próprios”. Acrescenta ainda que é fundamental para qualquer médico perceber um ensinamento de base e nunca esquecê-lo: “não está perante um doente, mas sim diante de uma pessoa, que tem de descobrir. Porque se for só a descoberta da doença que mora naquela pessoa, a Medicina não funciona”.

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