O segundo dia de trabalhos da 25ª Conferência Mundial da WONCA esteve recheado de atividades científicas de índole diversa, sempre com uma forte participação lusa, quer ao nível de apresentação de comunicações, quer na organização de workshops práticos e interativos. Uma destas formações envolveu um grupo de médicos de família portugueses, turcos, espanhóis e checos e esteve centrada na gestão de doentes diabéticos muçulmanos durante a época do Ramadão. Assim, o workshop «Fast but not furious: helping patients manage diabetes during ramadan» procurou “capacitar os médicos no sentido de conseguirem oferecer os melhores cuidados aos doentes diabéticos, sabendo de antemão que os doentes diabéticos muçulmanos têm esta particularidade de fazer jejum prolongado no Ramadão. Cada vez mais nos começamos a deparar com este desafio: para se ser um bom MF e tratar bem os doentes diabéticos temos de ter esta competência cultural”, avança Rita Abecasis, da USF da Baixa. A jovem médica sublinha que a equipa daquela unidade de saúde “tem conhecido um aumento significativo de população estrangeira em lista, tal como sucede em muitas nações da Europa. Pareceu-nos útil sermos pró-ativos e ir ao encontro das necessidades destes utentes, já que responder de forma precoce aos seus problemas contribuirá para que a sua saúde, no geral, seja melhor, a pressão sobre o sistema de saúde menor e a autossuficiência na gestão da doença mais acentuada por parte do doente, algo que entronca na missão essencial do MF de educar para a saúde”.
Vários membros do Grupo de Estudos de Doenças Respiratórias (GRESP) da APMGF dinamizaram um workshop centrado na temática da espirometria e ancorado na lógica da gamificação, na tentativa de aproveitar as novas tecnologias como rampa de lançamento para a aprendizagem de novos conceitos e práticas. “Este modelo de formação funcionou maravilhosamente bem e tivemos uma sala cheia, sem lugares disponíveis inclusive no chão! O que procurámos fazer foi pegar numa oficina tradicional que já realizamos historicamente no GRESP e relacionada com a espirometria (é, aliás, uma formação que o nosso grupo tem apresentado inúmeras vezes e em muitas regiões do país), mas desta vez tornando-a mais dinâmica e interativa, com o apoio das novas tecnologias e de um jogo, de forma a chegar mais perto das expetativas sobretudo dos internos e jovens MF”, explicou Pedro Fonte, membro do GRESP. Na sua visão, “esta nova abordagem consegue, por vezes com assuntos complexos ou um pouco enfadonhos, tocar nos pontos essenciais da temática de forma mais leve e dinâmica. É certo que corremos o risco de ter pessoas que não conhecem as bases da espirometria e que ficam, na verdade, sem a possibilidade acompanhar o que é transmitido, perante a ausência de palestras mais aprofundadas. Contudo, este tipo de oficina suportada na gamificação, com uma hora de duração, é excelente para chamar a atenção para pontos fundamentais. Tivemos aqui no evento da WONCA o lançamento da oficina nestes moldes, com o suporte de um jogo, uma espécie de prova. Iremos agora fazer ajustes, de acordo com a nossa própria análise e feedback dos participantes e contamos em outubro, nas próximas Jornadas do GRESP, estar presentes com esta oferta, na versão em português”.
Neste segundo dia da Conferência Mundial da WONCA foram também marcantes as duas keynote lectures proferidas por altos responsáveis da Organização Mundial de Saúde (OMS). O Diretor Regional da OMS para a Europa, Hans Kluge, explicou por que motivo na sua opinião o horizonte da saúde e do bem estar no Velho Continente se mistura com a evolução dos CSP, afirmando sem reservas que “nós, profissionais dos CSP, somos os autores do futuro. Podemos escrever um novo capítulo que seja mais justo, mais forte e repleto de esperança para as atuais e futuras gerações”. Por seu turno, Jim Campbell (Diretor da Força de Trabalho em Saúde da OMS) abordou as medidas e estratégias que devem ser adotadas em cada país e região mundial para acelerar o crescimento e solidificação dos recursos humanos em saúde, até ao final da década. Na perspetiva deste especialista, parte substancial desta missão cabe aos organismos que representam os médicos e demais profissionais de saúde, que têm a responsabilidade última de pressionar e influenciar administrações e poder político no sentido de tomarem decisões acertadas, sempre com o suporte da evidência e dos dados. “Gostaria de vos desafiar, em termos individuais, a tentarem perceber como, através dos vossos grupos de interesse e de trabalho, das vossas sociedades e colégios, dos representantes que elegem, poderão ajudar as pessoas que estão em cargos de influência – sejam ministros das saúde ou outros – a agirem com vista ao fortalecimento da força de trabalho em saúde nos CSP (…) Mas, se desejam que um governo invista dinheiro no desenvolvimento e manutenção de recursos humanos em saúde, é fundamental entenderem a necessidade de encetar diálogo com os políticos e de marcar a sua agenda. Encontrem o vosso caminho até ocuparem tal espaço e façam-se visíveis aos olhos de quem decide, ao mesmo tempo que mostram (com documentação e estudos) como já foi medida e testada a eficácia e rentabilidade da MGF. Coloquem toda esta evidência científica e informação no domínio público!”.