Pré-conferência do EYFDM em Lisboa mostrou que jovens MF estão preparados para desafios do futuro

Durante dois dias a capital portuguesa foi palco da Pré-Conferência do European Young Family Doctors Movement (EYFDM), grupo de internos da especialidade de MGF e jovens médicos de família (MF), anteriormente conhecido por Movimento Vasco da Gama (VdGM), iniciativa realizada antes da 25ª Conferência Mundial da WONCA. Assim, acorreram a Lisboa perto de 300 internos de MGF e jovens médicos de família (recém-especialistas com até cinco anos de exercício totalmente autónomo), oriundos de 58 países.

O evento ficou marcado por muitos momentos de partilha de experiência e aprendizagem e por keynote lectures e palestras marcantes, desde logo a proferida por João Sequeira Carlos, ex-presidente da APMGF e do VdGM na abertura dos trabalhos, que lembrou os tempos fundadores do movimento, a energia e paixão ali libertadas e que ainda hoje permanecem enquanto características distintivas do EYFDM.

Para Madalena Leite Rio e Nick Mamo, co-chairs da iniciativa, “esta pré-conferência adivinhava-se especial por vários motivos, sendo um deles o 20.º aniversário do Movimento Europeu de Jovens Médicos de Família, fundado precisamente em Lisboa, em 2005, sob o nome de Vasco da Gama Movement. Regressar à casa de partida, agora mais maduros, mais numerosos e mais determinados, trouxe consigo uma enorme responsabilidade. Quisemos criar um espaço fiel aos valores da WONCA, mas que também fosse inovador e mobilizador. Preocupámo-nos em desenhar um programa diversificado e inspirador, garantindo que todos os participantes, independentemente da sua origem, encontrassem temas com que se identificassem e oportunidades reais de aprendizagem e partilha”.

Tendo tudo isto em mente, os organizadores quiseram ir ainda mais longe: “assegurar que, dentro do que estivesse ao nosso alcance, faríamos de tudo para que esta fosse uma pré-conferência economicamente acessível, sustentável do ponto de vista ambiental, inclusiva e amiga dos bebés e das famílias”.

Madalena Leite Rio frisa que os participantes “viveram uma experiência intercultural intensa: workshops interativos, conferências, apresentações científicas e intercâmbios clínicos, sempre com espaço para diálogo e troca de perspetivas. Contámos também com oradores inspiradores. João Sequeira Carlos fez uma retrospetiva do percurso do EYFDM e dos YDMs, levando-nos a refletir sobre de onde viemos, onde estamos e para onde queremos ir. Viviana Martinez-Bianchi destacou a força da ação coletiva e a importância de agirmos de acordo com a máxima “Lift as you Climb”. Muna Chowdhury trouxe-nos a relevância do equilíbrio e da saúde mental na nossa profissão e Mayara Floss encerrou com uma mensagem de esperança, comunidade e compromisso com o planeta, partilhando as razões que a fazem manter a paixão pela Medicina Geral e Familiar — e pela vida”.

Por seu turno, Nick Mamo destaca os momentos fora da componente científica, propriamente dita: “acreditamos que esses momentos foram igualmente importantes. Antes da pré-conferência, 22 jovens médicos participaram em intercâmbios em unidades de saúde de Lisboa, conhecendo de perto o modelo português de cuidados de saúde primários. Recebemos estes colegas com um jantar internacional, na sede da APMGF, onde cada participante trouxe algo do seu país de origem, proporcionando uma experiência culturalmente rica e memorável. Tivemos ainda uma noite muito especial no Jardim Botânico da Ajuda, onde plantámos uma árvore. Se tudo correr bem, esperamos que as aprendizagens e os laços criados e fortalecidos nesta pré-conferência possam também imitar o crescimento desta árvore: firmes, assentes em raízes fortes, bem nutridos e cheios de vida”.

Na perspetiva da presidente do EYFDM, Daria Gheorghe, “o grupo conheceu uma ótima evolução nos últimos 20 anos, começando como um coletivo composto por um punhado de pessoas, em 2004, até se tornar hoje um grande movimento europeu, que integra 31 delegados nacionais, com participação ainda de outras nações que não possuem nesta fase representantes diretos nas nossas estruturas”. A dirigente assinala também o grande sucesso das várias pré-conferências do EYFDM, concretizadas antes dos eventos major da WONCA, assim como do Fórum do EYFDM, “cujas últimas edições esgotaram, revelando que os jovens MF estiveram e continuam a estar muito interessados no trabalho que fazemos e na troca de ideias entre realidades diferentes”. De facto, Daria Gheorghe está convicta de que a nova geração de médicos “reconhece a importância das relações no plano internacional e do como é vital acarinhá-las. Prova disto mesmo é o largo número de colegas que se mostram, todos os anos, empenhados em participar nos intercâmbios que antecedem estas conferências, com vista a perceberem de perto como funcionam outros sistemas de saúde e levarem as lições mais importantes para os seus países de origem”.

Ao contrário do que acontecia no início do século, quando os internos e jovens MF se viam envolvidos ainda em árduas batalhas para a consolidação e reconhecimento público da Medicina Familiar como especialidade clínica autónoma, na maior parte do Velho Continente, no presente as lutas são de outra índole, mas não menos exigentes, como explica a presidente do EYFDM: “as carências ao nível da força de trabalho constituem um problema em muitos países europeus, já que temos uma população que vive mais anos, com forte carga de doenças não transmissíveis e crónicas, a qual exerce pressão adicional sobre uma força de trabalho onde escasseiam médicos, mas também outros profissionais de saúde. Este é um desafio central, o de lidar com um maior número de doentes com comorbilidades e necessidades em saúde, à medida que os recursos humanos se restringem, em alguns locais. Não podemos ainda desprezar os conflitos, guerras e crises que afetam a realidade europeia e que têm influenciado fortemente o quotidiano de muitos colegas em determinadas geografias”.

Numa nota mais positiva, Daria Gheorghe defende que os jovens MF “desempenham um papel importante na consciencialização do impacto das alterações climáticas na saúde humana e na promoção de estilos de vida mais saudáveis, convencendo os doentes a fazerem alterações dietéticas, a movimentarem-se mais e a usarem menos vezes meios de transporte que contribuem para a emissão de CO2”.

Ana Teresa Fróis, jovem especialista da USF Cedofeita, foi um dos participantes portugueses nesta pré-conferência, dando assim continuidade a um caminho de descoberta transnacional da MGF que encetou de há uns anos a esta parte: “estive em Bruxelas, numa outra conferência da WONCA e pré-conferência do EYFDM e gostei muito da partilha das nossas experiências enquanto internos. Agora, depois de concluir a especialidade, quis ter esta nova visão de quem está do outro lado, sempre na ótica de aprender um pouco mais sobre a realidade dos outros países, aproveitando também o facto do evento se realizar em Portugal”.

A jovem médica da USF Cedofeita garante que a iniciativa correspondeu às suas expectativas e que foi possível, através da interação com colegas de todo o mundo, entender como a Medicina Familiar “tem muita coisa parecida ao longo dos territórios, mas também muita coisa diferente, que pode ser apreendida no contacto com os outros. No cômputo geral, foi uma vivência bastante enriquecedora”. Ana Teresa Fróis acredita, por outro lado, que é sensato manter a organização de uma pré-conferência focada nos profissionais que estão a iniciar o seu trajeto: “o contexto que envolve os internos e jovens MF tem as suas particularidades e estes momentos ajudam-nos a definir aquilo que faz sentido para a nossa carreira, daqui em diante”.

 

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