O percurso de um Médico de Família é, indiscutivelmente, marcado pela atualização e formação contínuas. O último ano de internato é crucial para a transição de papéis e para a consolidação de conhecimentos e práticas clínicas. Nesse contexto, eu e a minha colega e amiga Inês Garcia Moreira decidimos participar em dois dos maiores encontros de Médicos de Família e Internos de Medicina Geral e Familiar (MGF) do mundo. No dia 23 de setembro, partimos para Dublin, cheias de entusiasmo para a EYFDM Pre-Conference e a 29th WONCA Europe Conference. A nossa aventura na Irlanda estava prestes a começar.
Este ano, a EYFDM Pre-Conference foi realizada em conjunto com a WONCA Europe e a Network of GP Trainees da Irlanda. Essa união foi muito positiva, pois permitiu-nos conhecer inúmeros internos irlandeses e de outras nacionalidades. Destacamos com orgulho a forte presença de portugueses nas conferências. O programa da Network of GP Trainees & EYFDM Pre-Conference foi excecional.
A dificuldade em escolher apenas uma das sessões paralelas evidenciou a qualidade do evento. A keynote de abertura, “Top Tips for Career Resilience”, da Professora Andree Rochfort, abordou a resiliência e a essência do Médico de Família de forma brilhante. Também mereceu destaque a sessão da Dra. Anna Beug, “Child Mental Health & Neurodiversity: Developing an Approach for Primary Care”, que nos ofereceu uma nova perspetiva sobre como abordar crianças e famílias com neurodivergências. Uma frase que nos marcou foi: “Children swim in the subconscious of their parents”.
Não poderíamos deixar de mencionar a sessão mais impactante da semana, a keynote de encerramento da Dra. Laura Nielson, “Dreaming, Working, Yearning, Trying, Failing, Flying & Everything in Between: What it is to be a Passionate Doctor in 2024”. A experiência foi indescritível, mas recomendamos a visita ao site da iniciativa (https://sharedhealthfoundation.org.uk/our-work/) e deixamos uma mensagem inspiradora: “Do dogs fly? Is it true? Some dogs don’t, and some dogs do”.
No dia 24, sob os ecos da dança irlandesa, começou a 29th WONCA Europe. As expectativas geradas na pré-conferência foram superadas pela dimensão e alcance da conferência. Com quase 2600 participantes, tivemos o privilégio de interagir com colegas de todo o mundo, incluindo Portugal, Irlanda, outros países europeus, Austrália e Macau.
Entre as palestras de destaque, a sessão “The Future Generalist: Managing Multiple Long-Term Conditions in General Practice”, da Dra. Susan Smith, capturou a essência do nosso trabalho. Uma frase do médico Julian Tudor Harte ressoou profundamente: “Os eventos mais satisfatórios na profissão foram aqueles que não aconteceram: Nenhum AVC, nenhum ataque cardíaco, nenhuma complicação da diabetes”. Também ouvimos o Dr. Alexandre Gouveia, que abordou o papel da inteligência artificial na prática clínica em “Clinical Uncertainty and Artificial Intelligence: Discovering New Routes in Primary Care”. Por último, destacamos o excelente trabalho das Dras. Dorien Zwart e María Pilar Astier Peña sobre Segurança do Doente, com a sua sessão “Your Health, Our Priority: Strengthening Care Continuity and Human Performance for Safety, Human Factors”.

Para encerrar a nossa experiência na Irlanda, eu e a Inês Garcia Moreira apresentamos o nosso trabalho sobre Segurança do Doente, intitulado “Trigger Tool for the Detection of Adverse Events: Validation for Primary Care and Application in Two Primary Healthcare Centres”. Fomos acolhidas por uma plateia corajosa que, às 8h30 de sábado, prestigiou a sessão, moderada pela Dra. Vera Costa, que tivemos a felicidade de conhecer. O caminho para a segurança do doente nos Cuidados de Saúde Primários (CSP) em Portugal está apenas a começar, mas acreditamos que a tradução e validação desta ferramenta será uma mais-valia para melhorar os cuidados de saúde prestados à nossa população. Esperamos continuar a contribuir para um sistema de saúde mais seguro para todos. Com a conferência terminada, levamos connosco memórias, novas amizades e experiências enriquecedoras, e, acima de tudo, o desejo de voltar, quem sabe já no próximo ano em Lisboa.
Inês Laia (Médica Interna de Medicina Geral e Familiar na USF Viriato – ULS Viseu Dão-Lafões)