APMGF defende que aumento da mortalidade infantil pode ser explicado em parte pela falta de investimento em recursos humanos

Convidado a comentar na CNN Portugal os dados revelados esta semana a propósito da mortalidade infantil, segundo os quais morreram em 2024 um total de 261 bebés com menos de um ano de idade, o mais alto valor registado desde 2019, o vice-presidente da Associação Portuguesa de Medicina Geral e Familiar (APMGF), António Luz Pereira, recordou que o indicador da mortalidade infantil “é um indicador fundamental porque é significativo do desenvolvimento de um país” e que podem existir várias razões a justificar tal evolução negativa.

A começar, desde logo, pela redução do “investimento que tem sido feito na Saúde, relativamente ao número de profissionais, não só na área da Obstetrícia, Pediatria e Medicina Geral e Familiar (MGF), mas na totalidade dos recursos humanos. Sabemos que temos menos médicos de família (MF) do que tínhamos há dois ou três anos e maior dificuldade em proporcionar acesso à população pela escassez de profissionais de saúde. Nas urgências, de ano para ano, o tempo de espera é cada vez mais elevado e não se coaduna com as necessidades da população. Aliás, este ano implementou-se o programa «Ligue Antes, Salve Vidas», com os tempos de espera nas urgências a resumirem-se apenas aos casos amarelos, laranjas e vermelhos (todos os outros acabam por ser direcionados para alternativas assistenciais) e nem assim se conseguiu que os tempos de espera nas urgências diminuíssem. De facto, o número de profissionais nas urgências tem de ser pensado em linha com as novas necessidades em saúde, na medida em que temos doentes cada vez mais complexos e com mais patologia, a exigirem um tempo de análise superior”.

O dirigente associativo garantiu que, ao nível do acompanhamento da Saúde Materna, existem problemas evidentes, já que “temos um tempo de espera para ecografia obstétrica em tendência crescente, nos últimos anos, algo que diminui a qualidade do acompanhamento”. A esta realidade acresce o obstáculo de termos no país “um milhão e meio de utentes sem MF atribuído, apesar de formarmos mais de 450 especialistas em MGF por ano. Porém, os concursos de colocação são lentos e não existem medidas que permitam que os nossos profissionais decidam ficar no Serviço Nacional de Saúde. Refira-se, inclusive, que no último concurso, apesar de existirem mais de 900 lugares a necessitarem de ser preenchidos, foram abertas apenas 235 vagas”.

António Luz Pereira adiantou, ainda, a importância de avaliar em Portugal com detalhe cada morte registada de uma criança, da forma mais célere possível: “não precisamos de esperar pelo relatório no final do ano para revermos 261 processos, até porque alguns deles já ocorreram quase há um ano. Esta análise deve ser rotineira e permitir que possamos redirecionar as nossas políticas de saúde para as necessidades atuais da nossa população”. Pese embora o desagrado público que esta estatística sanitária provocou nos últimos dias, o dirigente associativo pediu que não se perca noção de um contexto mais amplo: “Portugal encontra-se entre os países mais seguros para as grávidas e crianças. Temos resultados melhores do que a média europeia e muito melhores do que a média da OCDE, figurando o país na lista dos melhores em termos de mortalidade infantil à escala mundial. Dito isto, estes valores não nos podem fazer parar, ou esperar que tal conjuntura se mantenha nos próximos anos. A nossa expetativa deve ser a de melhorar ainda mais tal resultado, uma vez que a Saúde evolui tecnologicamente e do ponto de vista científico estamos cada vez mais capazes de abordar estes problemas”.

 

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